domingo, 14 de junho de 2009

Sofrimento cordial

Para brasileiro, forma de sentir a dor e o luto prende-se menos ao conceito e mais à intuição

OSWALDO GIACOIA JR.
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nascida do espanto, da admiração genuína, a palavra do filósofo tem o dom de apreender, elaborar e formular o que caracteriza essencialmente um tempo ou figura do mundo René Descartes [1596-1650], o pai da modernidade filosófica, é um exemplo maior dessa capacidade de colocar em relação o pensamento e a verdade.
Decepcionado com a aridez das disputas escolásticas e confiante nos poderes da razão esclarecida pela lógica e pelas matemáticas, ele vislumbrou aquilo que pode ser considerado como o espírito dos tempos modernos.
No célebre "Discurso do Método", Descartes considerava que, ao invés "dessa filosofia especulativa que se ensina nas escolas, se pode encontrar uma outra prática, pela qual, conhecendo a força e as ações do fogo, da água, do ar, dos astros, dos céus e de todos os outros corpos que nos cercam, tão distintamente como conhecemos os diversos misteres de nossos artífices, poderíamos empregá-los da mesma maneira em todos os usos para os quais são próprios, e assim nos tornar como que senhores e possuidores da natureza".
A profecia cartesiana, inspiradora da Ilustração, realizou-se plenamente nos séculos que se seguiram àquele em que viveu o filósofo. Efetivamente, a emancipação da razão humana em relação à ignorância e à superstição teve o efeito de livrar-nos do medo, de prover nossa segurança e bem-estar e de nos instalar no mundo na condição de "senhores e possuidores da natureza". A racionalidade lógica conseguiu desvendar os mais ocultos mistérios e colocar a serviço da humanidade as
forças e recursos naturais.

Ilustração
Um pouco mais tarde, outro ícone francês também trilharia o mesmo caminho cartesiano da Ilustração, estendendo o ímpeto da racionalidade técnico-científica a todos os domínios da cultura e do espírito.
Com efeito, o positivista Augusto Comte ousou a racionalização da própria religião, transformando as tecnologias sociopolíticas em catecismo da humanidade, e a ciência política em religião positivista, com suas divindades, dogmas, sacerdócio e culto. Assistimos há pouco, chocados, à tragédia do voo 447 da Air France, em que os "elementos", em sua positividade bruta, parecem ter se revoltado contra seus novos senhores e possuidores, com seus esquemas e conceitos.Temos, de um lado, um aparelho tecnológico de altíssima complexidade e valor, uma aeronave inteligente, artefato no qual se encontrava embutido um volume extraordinário de saber, capaz de realizar prodígios em
termos de transporte e segurança.

Queda
Esse avião parece ter sido abatido em pleno voo, na noite de 31 de maio.Todo mundo acompanhou as notícias, cada povo de acordo com seu caráter próprio, a seu modo, com o espírito que o particulariza. Interessante observar o contraste entre as reações oficiais e populares dos franceses e dos brasileiros. As autoridades francesas, a Air France, as instâncias militares e civis competentes primaram pela sobriedade, pela discrição, pela objetividade no trato com os parentes das vítimas, no modo de elaboração dos lutos privado e público. Nomes foram resguardados, a reação governamental foi pronta e eficiente, o mesmo se diga do aparato militar de resgate mobilizado tanto na França como no Brasil. Sem estardalhaço, sem sensacionalismo, sem grandiloquência de gritos e gestos, com eficácia e racionalidade cartesiana No Brasil, as formas de reação foram e estão sendo muito diversas. Nosso processamento do luto tem outras coordenadas, somos mais intuitivos e sentimentais, na felicidade como no infortúnio.Este último, entre nós, é metabolizado afetivamente com paixão, somos ávidos de cenas e palavras sensacionais, nosso sofrimento tem a forma da ferida exposta, temos necessidade de falar obsessivamente do que aconteceu, de acompanhar passo a passo as movimentações, repisamos incessantemente os mesmos fatos, multiplicamos hipóteses, somos pródigos em elucubrações.Ligação com o trágico Antes de tudo, temos necessidade de nos mantermos ligados ao trágico acontecimento, de alguma forma. Somos solidários na dor, mas temos que fazer muito barulho. Afinal, somos o país do Carnaval, do samba e do futebol, da produção espetacular, mesmo do horrível. Não nos condenemos por isso, pois essa forma de luto tem a ver com nossa maneira de ser.Percebemos aqui a diferença entre uma valorização da razão e do conceito, por um lado, e uma valorização do elemento intuitivo, sensível, por outro.O homem intuitivo, quando sofre, sofre com veemência, com espalhafato.Como afirmou certa vez Nietzsche, o homem intuitivo, no sofrimento, "é tão irracional quanto na felicidade, grita alto e nada o consola. Como é diferente, sob o mesmo infortúnio, o homem estoico, instruído pela experiência e que se governa com conceitos!"."Ele, que de resto só procura retidão, verdade, imunidade a ilusões, proteção contra as tentações de fascinação, desempenha agora, na infelicidade, a obra-prima do disfarce: não traz um rosto humano, palpitante e móvel, mas como que uma máscara com digno equilíbrio de traços, não grita e nem sequer altera a voz; se uma boa nuvem de chuva se derrama sobre ele, ele se envolve em seu manto e parte a passos lentos, debaixo dela."Modos de sentir e pensar são maneiras de ser. O fundamental é apenas uma autêntica solidariedade na dor, na vivência do luto, na assimilação do choque, cuja violência brutal dilacera os horizontes de sentido que criamos para nos curar das feridas da existência.

OSWALDO GIACOIA JR. é professor de filosofia na Universidade Estadual de Campinas (SP) e autor do
"Pequeno Dicionário de Filosofia Contemporânea" (Publifolha).

São Paulo, domingo, 14 de junho de 2009

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Art class: how to creat your own sense, or, thanks forever to my admired professor Mike, dressed up as good as it gets!


Mariana: ...taking the opportunity, if you don't mind...What do you answer to your students when they ask you (if they do) about the practices of non-essentialist thought? I mean, where do we find a sense (meaning objective) to our lives then? How not to fall into the relativism black hole, or should we? My students always talk about "real life", food, poverty, power and so...

Shapiro: there's no one way to answer those who want to resist non-essentialist thought. MY answer is that to recognize that there is no one place from which the life world can be validated is to recognize that the meaning of YOUR life is up to you. I found - once I fully gave up on any idea of transcendent and/or stable meaning that what life means is open to practices of negotiation, both between and within selves. That is of course hard work, but such "work" is what makes life exciting and worth living. Why live a life that someone else has invented, institutionalized, and then covered over with false assurances? And, further, why not invite every one into a life of shared invention rather than shared ritual?

somewhere in 2007

amor de transição

eu sei e você também
que não nos apaixonamos
somos amor de transição

eu não quero mais aquilo
você também não
eu quero amor de outro lugar
você também
mas não somos o que queremos
mas podemos ir sendo

doce, calmamente
nos reconhecendo e depois
nos conhecendo

sim, eu quero a sua boca
não a quero loucamente
quero-a na paz
que cabe o amor na minha vida
agora

dá-me a mão
ouçamos músicas juntas
façamo-nos carinho
ajudemo-nos

e só o tempo sabe o que será
depois que nós voltarmos a nós
juntas

MIT Class: you can never get enough of what you don't really need

sinto-me triste
aquele não lugar
toma conta de mim
e volto a achar a todo instante
que a vida deles é melhor

ela lá longe
e é como se ela fosse feliz
e eu não
eu sempre não

porque sou
pesada
intensa
séria
chata
pontual

e para além disso

sou de horas
horas boas
horas péssimas
horas pensando sobre
as diversas horas

e eu queria ser artista
e voar
e ter fama
porque a fama
como que conta pra gente
aquilo que aquele que a tem
não vai acreditar nunca:
que se é feliz,

ou: you can never get enough of what you don't really need (to make you happy), Eric Hofer (MIT)

a justiça tarda e falha:
diria Waly Salomão:
mas o sonho não acabou
porque a vida é sonho

novembro, 2008

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Pós-estruturalismos e delírios católicos ou místicos; comme tu vê.



Nélio era um psicanalista que se cansava às vezes. Mais uma terça feira de mais uma semana. E ela continuava ali. Ultima paciente do dia. Como todos os três dias da semana em que ele a atendia. Ela continuava com a neurose obssesiva da rejeição - sempre em seus termos porque aqui não se cabe pensar no que é certo – ela jogava todas as suas escolhas em cima daquela primeira rejeição. Era sempre o outro a não dar conta dela, e ela ó coitada, tentava tudo o que era CERTO para ser amada. Mesmo que ela mesma, não amasse, no fundo.
Por vezes ela podia ficar bem histérica. Talvez fosse esse o motivo dos últimos cansaços de Nélio. Conter uma crise de histeria lhe era exigente. Como se o psicanalista tivesse que dar um pouco do seu equilíbrio para aquela pessoa ali, que lhe pede qualquer mínima paz. Vai um tempo para a recomposição. Mas ela, era incansável. Ainda com certa compreensão, fez questão de anunciar pra Nélio sua sensibilidade em relação ao cansaço dele, chamados por ela de distância e quietude. Nélio ria sempre nessas horas. Quando pensava em seu crescimento como analista, Nélio sempre agradecia quando aprendera que o riso era definitivamente o melhor remédio para todas as horas. Claro que a habilidade de poder rir nas horas certas tinha vindo com a longa experiência dos tantos anos de divã. Seus e de seus pacientes. Ela estava prestes a entender que tudo tinha acabado. Nélio vinha tentando esse dia há tempos, Mas o que a cabeça pode fazer com as pessoas! Numa das sessões difíceis, Nélio precisou mostrar pra ela o quanto suas atitudes eram um desafio para sua tão grande inteligência. Ela era sim extremamente inteligente. O que muitas vezes dificultava o trabalho de Nélio. Não só inteligente, também muito sensível. Segundo explicações que ela própria apresentava a Nélio, isso era devido ao seu sol em escorpião e sua lua em aquário. Parece que segundo a astrologia, isso era uma mistura intensa de intuição e sensibilidade e uma inteligência racional para além do comum. Não só isso, para ela, a mistura astrológica trazia-lhe a missão revolucionária. Uma Joanna D’arc na fogueira da lenha das florestas brasileiras sendo irracionalmente destruídas por aqueles seres menores do que ela. Que ela sempre denominava, Os humanos.

Sensitive Cosmopolitans

Estou cansada.
Muito cansada.
De mim e dos outros
Das dores da vida
Das soluções da vida
Compra um cd,
lê um livro,
assiste um filme,
toma um rivotril,
entra no Orkut,
facebook,
email,
antidepressivo,
fuma maconha,
Faz terapia,
trabalha.
Trabalha,
toma um rivotril, e ainda sente dor.
Bebe.
Tem ânsia,
muita,
muita ânsia.
Vomita.
E dói mas acalma.
E chora.
CHEGAAAAAA CHEGAAAAA.
Chora.
Deita.
Posição fetal,
edredon.
E chora.
Range os dentes de dor,
contorce.
Ouve Betânia.
Ouve Betânia.
Acende velas.
Toma banho.
Queria banheira.
Chora.
Acaba o banho,
passa creme e higieniza a boca.
Quanto mais arde melhor.
Entende as pessoas que se cortariam por dor.
Apaga a vela.
Deita na cama.
Liga a TV muda.
Acende um beck.
Chora.
Vira-se.
Dorme.


silêncio

a voz humana se me chega
em horas de mim
me tira

os tons invadem minha
mente como pontadas
que me torturam

eu tento acolhe-las em meu coração
mas é por demais
sufocante

eu me preciso muito
e qualquer externalidade não desejada
agride

eu quero voar para o silêncio
de mim
onde reside
meu descanso
e minha fonte de vida

maio 2008

Sóis negros, ou, para clarices e kristevas









O sol negro é o
contrário
trago pra mim toda
a escuridão
para que a luz
fique ativa
eu não ilumino
eu não deixo a escuridão sair
eu contenho tudo o que
eu
acho que eles não gostariam
eu os quero felizes
se se é o buraco negro de sofrimento
tudo a volta
é luz
a lua ilumina
o sol negro contém a escuridão

(maio, 2008)

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Lições de economia l: O dinheiro realmente é conseqüência

A empresa flui,
Eu fluo.
Não.
Eu fluo,
A empresa flui.

À Dom Pedro, minha independência



Sejamos um para o outro exatamente
O que estamos
Sendo

Que eu não te tolere
E se isso acontecer
Que eu te cuspa
Na cara

E que você se vá
Avante no bairro alto
Farreie
Coma lindas putas

E ao voltar
Traga-me rosas
Um poema
Uma música na calçada
E eu te acolherei
E depois do banho
Baterei-te eu, na tua cara

E você me amará
Com amor e tesão

E eu me entregarei
E falaremos então de

Praias
Disfarces
Músicas
Cavalos
Camelo
 
E eu voltarei a sonhar.

(04.10.2008)

Ausências

And here we are
They are all set
Playing their roles
Happily and enthusiastically
I’m away
Always hungry of
Something else

HITZ

Sentada aqui penso

no que pensar

e tudo continua o mesmo

dessa vez ainda mais

caído

e quanto mais saio

mais quero estar em casa

a sós

e ainda assim digo a ela

boa noite

toda noite.

saudar a não existência

d’Ela

e fazer dessa ausência

meu sentido e afago

é mais fácil

do que tê-la.

e o espero chegar

e há pouco esperava

o psiquiatra me chamar

e de quantas esperas se faz essa

espera maior por isso que há

de vir

mesmo que o que venha

seja o fim?

E não sei mais o que fazer para me interessar por eles

Ou por elas

Eu quero sim um cheiro no pescoço

Mas e o que existe até lá?

E o entre o total desconhecimento

E a intimidade?

O que colocar quando não se vislumbra mais nada?

E sim, eles são lindoa

E as cores vibram nas boteilles

E o vermelho reluz todos esses desejos

Querendo um encontro

E está-se então

Num mar vermelho

De desejos desencontrados.

Red decadence

terça-feira, 2 de junho de 2009

Diálogo fofo em momento de desespero, ou, de Mari pra Mari

21.5.09

- Depois que a gente aprende a chupar cana, assobiar, meditar e dar gargalhada tudo ao mesmo tempo, qual é a hora que eu me jogo da janela? Você sabe me dizer? Já chegou lá?

- Quando a Sininho vem para a janela do seu quarto e dá o pózinho para você sair voando.

http://tresfantastique.blogspot.com/

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Os nojentos e os assépticos, ou: EU SEMPRE GOSTEI DOS SUJINHOS!

São Paulo, domingo, 31 de maio de 2009
Folha de São Paulo

PLÍNIO FRAGA
Os nojentos e os assépticos

RIO DE JANEIRO - É bastante aceita a percepção de que esquerda e direita não existem mais, limitando-se a rótulos sem sentido num mundo pós-ideológico. Por extensão, começa a ser questionada a identificação de valores progressistas ou conservadores no jogo político. Numa sociedade individualista, tecnológica, na qual capital e ideias mantêm-se em circulação não regulada e contínua, amontoam-se nos destroços do pensamento as ambições coletivas -hoje centradas em nichos que necessitam de preservação, como, por exemplo, os ambientalistas.
Mesmo assim há parâmetros, em regra geral, para a distinção entre conservadores e progressistas. Ao formar seu juízo, conservadores dão mais importância a conceitos como ordem, lealdade, tradição, nação, fé, pureza e decência. Progressistas, ao estabelecerem parâmetros de julgamento, priorizam valores como igualdade, justiça, fraqueza, vulnerabilidade, expressão individual e compaixão.
É um sucesso na internet -em especial depois da citação de um colunista do "New York Times"- o site YourMorals.org, elaborado por especialistas de uma universidade americana que estudam as razões pelos quais o homem é o único ser que desenvolveu a noção de nojo -e como muitas sociedades recorrem a esse sentimento quando se defrontam com ameaças sociais.
Uma das teses do estudo é que conservadores e progressistas não só pensam de maneira distinta mas também sentem de modo diferente. De acordo com a pesquisa, a preocupação com contaminação ou a percepção de nojo é maior entre conservadores do que entre progressistas. Será que isso explica por que Hitller tinha obsessão pela assepsia e Che Guevara foi apelidado de "Porco" na escola?
Talvez só mostre que política é questão de gosto. Ou de nojo.

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