Ela batucava o samba da ereção da Orquestra Imperial do Brasil na Box do DVD de Pecados Inocentes – aquele com a Juliane Moore, que ela amava. Estava em surto, e queria tentar responder a ele, o surto, com muito bom humor.
Tinha ganhado de seu psiquiatra o aval para diminuir a dose do anti-depressivo, e graças a isso, também tinha ganhado mais uma receitinha das pretas. Ela gostava. Empolgou tanto que demorou dois dias para pensar em comprar o remédio que tinha acabado dois dias antes. Ela sabia que estava em surto sem remédio. E ela ria. Andava preferindo deixar vir, falar logo com Iansã, cantar pra Mãezinha do céu, se entregar a Caetano.
Começa a organizar; organizar é o melhor a fazer em momentos assim. E ela sempre se lembrava DELA, a senhora do coração de águas e membros de fogo, que lhe ensinara lá atrás que a desordem de fora revelava sempre a desordem ainda maior de dentro. Para uma criança àquela época, isso só queria dizer: puta mulher neurótica ;-)
E ELA sempre a queria linda. Escova nos cabelos, vestidos cor-de-rosa, capas de caderno da moranguinho. Que erro de calculo! Mas que carinho. E que força. Porque sim, a história DELA tinha sido difícil, bem difícil. Outro erro de calculo era ela pensar que os outros eram capazes de entenderem as dores dos outros. Nunca ninguém sente igual. E isso a frustrava imensamente. Mas também era desse lugar que ela trazia tanta, tanta empatia. Ela deveria concorrer à prefeitura da cidade.
Dada a sua mania de valorizar a sinceridade e a honestidade acima de tudo, ela criava muitos, muitos incidentes diplomáticos. Mas no fundo, as pessoas confiavam NELA. Afinal, quem num quer uma pessoa de verdade nos dias de hj para ter pelo menos meia hora de conversa de verdade? E ELA ainda vendia flores. Não é heroína uma mulher de coração de água, membros de fogo, cabeça de ar que age na terra disseminando flores?
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